sábado, 28 de março de 2015

OS FANTASMAS NOTURNOS E AS VISÕES SOBRENATURAIS por PAUL SEDIR (1a parte)

                    

“Tudo acontece em parábolas,
a fim de que,  vendo, vejam
e não percebam;
e ouvindo, ouçam e não  entendam”.
                                                                                      Mateus,  IV,  12

Durante um terço de nossa existência, nossa ser consciente é condenado ao  repouso. O discípulo cuidadoso e escrupuloso em nada desperdiçar na Natureza e de utilizar todos os recursos oferecidos por ela, espontaneamente, transforma estas horas em trabalho espiritual. É o método desta transformação que hoje explicarei a todos.

Os materialistas ensinam que os sonhos são, ou de origem fisiológica: má digestão,  má circulação, ou de origem mnemônica: lembranças conscientes e inconscientes, associações de idéias por séries sem nexo. Há, de fato, sonhos produzidos por estas causas, e que não possuem nenhum valor espiritual; mas há inúmeros que possuem uma origem objetiva, exterior ao ser e  que contêm  um sentido profético, iluminador ou taumaturgico. Estes são os sonhos propriamente ditos; As Escrituras fornecem inúmeros exemplos.

Vamos primeiro nos reter no fenômeno do sono, depois no mecanismo do sonho; em seguida, procuraremos onde se manifestam as cenas sonhadas;  estudaremos os efeitos dos sonhos, seus significados e enfim a maneira de se preparar para ter sonhos reais.


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Não seria útil detalhar todos os sistemas complexos, elaborados pelas diferentes escolas de esoterismo, sobre a constituição do homem. Tenhamos em vista a mais simples.

Além do corpo físico, por si mesmo não é mais que uma  matéria  inerte, três  princípios se unem na composição humana:

* A  vitalidade, o od,  o magnetismo, o duplo;

* O espírito, intermediário parcialmente consciente pelas faculdades sensoriais e  mentais, na maior parte inconsciente para todos os outros órgãos de  relação com o Invisível; é a sede do Eu, da vontade, do livre-arbítrio;

* A alma, essência eterna, incriada, luz do Verbo, atualmente uma lamparina,  mas que tomará todo seu esplendor no momento de nosso novo nascimento místico.

Durante o dia, é o espírito consciente que governa por meio da força nervosa cérebro-espinhal; à noite, esta força estando esgotada, o consciente repousa, enquanto que os acumuladores se re-carregam pelo cerebelo; o espírito  inconsciente, se podemos falar em saída, se distancia do corpo, e às vezes, de fato, se divide; e os atos efetuados em seus trajetos, os encontros feitos, as  cenas às quais assistiu, somente se transmitem à consciência se houver no corpo, e  sobretudo no cérebro, muita força nervosa para registrá-los. Assim, sonhamos constantemente, mas lembramos muito raramente.

Este espírito, intermediário entre a alma e o corpo, não é um halo, uma aura, um ovo fluídico; é um verdadeiro organismo, bem mais complexo e mais  delicado que o corpo de carne e cujos numerosos proprietários assentam em localizações diferentes. Ele possui funções de nutrição, respiração, de  inervação; dos órgãos de locomoção e de percepção; uma inteligência, livre arbítrio; e cada uma destas faculdades se corresponde com uma das partes do corpo físico. Assim como o músculo  engrossa em razão do trabalho regular imposto, igualmente  este espírito se desenvolve  pelos exercícios que lhe são próprios: ambição, inquietude,  esforço  de vontade, virtudes,  vícios. Os treinamentos artificiais do esoterismo o desenvolvem também, mas de uma maneira precoce e anormal. De todos os trabalhos do espírito, somente a luta contra o egoísmo o afina e purifica. 

Além disso, igualmente, no corpo de carne, entram pela alimentação e   respiração, moléculas de toda ordem; no espírito, entram, se instalam, repartem, vivem e morrem todos os tipos de espíritos subordinados. Estas  visitas produzem na consciência as intuições, as idéias, os sentimentos, as descobertas, elas tornam possíveis os acontecimentos da existência, as doenças, os reencontros; enfim  participam na produção dos sonhos.
  
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Durante o sono, o espírito se aventura mais ou menos para longe. Quando      ele vai para um país bem desconhecido, ele se encontra estranho, pois nem seus próprios elementos, e nem as células corporais, possuem afinidades com  as coisas desta região. Devemos observar, se instruir, ir e vir, mas o cérebro não tem como levar à consciência estas explorações, pois suas moléculas  são incapazes de registrar mensagens que não as façam vibrar.

Quando o passeio é curto, ocorre o contrário, como os objetos são mais familiares, a experiência é registrada.

É preciso dizer que estas excursões podem ocorrer durante o dia; mas neste caso nada percebemos, porque a força nervosa é quase toda inteiramente empregada nos atos da consciência, e também, porque nosso cérebro não é robusto o bastante para suportar uma dupla tensão, nem nossa vontade é calma o suficiente para resistir aos desejos novos que nasceria desta segunda vida.

Os sonhos substituem vantajosamente todas as invenções pelas quais a ciência esotérica estabelece as ligações do homem com o invisível. É um fenômeno normal, sadio, acessível a todos. Nenhum gênero de vida especial é pedido. Além do mais, a Natureza prepara com cuidado as melhores condições; o meio é organizado visando nossa instrução noturna como é organizado para nossa substancia corporal. Durante a noite, a circulação magnética-telúrica muda, a atmosfera é desbaratada de certos elementos muito ativos; a lua substitui o sol amarelo, outras ordens de gênios se aproximam da terra; o sol, o mar, as árvores, os animais emanam uma áurea especial e exercem uma  influencia propícia ao desprendimento do espírito.

Tudo isto pode se tornar causa de um sonho: os anjos, os deuses, os demônios, os defuntos, os clichês, as imagens deste que foi, os fluidos em deslocamento nos espaços interiores, os espíritos das coisas e dos viventes, as imagens deste que passa na hora, e de tudo que terá lugar até o fim, em uma palavra, a Vida toda inteira pode tornar-se reflexo no espelho translúcido da imaginação. 

Mas, os fatores mais freqüentes dos sonhos são os clichês do destino pessoal e as visitas dos membros da família espiritual.

Nosso eu central se prende, vocês sabem, ao coração do Universo, no plano do Verbo;  Somos agrupados em famílias. Cada um destes grupos, onde, todos os membros se parecem, mesmo corporalmente, e, naturalmente fazem trabalhos  idênticos, seguem a mesma estrada. Assim, por exemplo, o mais velho da família à qual pertenço possui, em maior perfeição, as mesmas faculdades que  eu mesmo; ele encontra seus diversos clichês, e sempre na minha frente; pode ser que ele receba o clichê da tuberculose aos trinta ou  cinqüenta anos e que eu, encontre somente em dez anos. Sob o ponto de vista de Sirius, este  tempo é insignificante; mas se já estiver nascido sobre a terra quando o “cabeça da fila” tornar-se tísico, posso em sonho ressentir uma dor no pulmão, para me prevenir da prova ainda distante.

Somente sonhamos coisas que possuam uma delegação, uma célula  física ou psíquica da mesma natureza em nosso ser. Para que um clichê me afete, é preciso encontrar em mim um ponto onde se agarrar. O sonho é este contato. É, por isto, que o único fato de ser advertido de uma prova diminui ou aumenta  nossa resistência; as miríades de pequenos gênios cujo trabalho nos faz viver se  inquietam então, preparam-se para a defesa e vão procurar socorro em toda parte.

Assim o ser do homem contém em si os germes de todas as felicidades, de todas as infelicidades e de todas as prerrogativas. Sua dignidade é, portanto, muito alta, sua missão grave e suas responsabilidades pesadas. 

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O sonho, observado do plano físico, possui três valores: o primeiro de  profecia, o segundo de instrução, o  terceiro de taumaturgia.

É profético quando produzido  pelo clichê de um  acontecimento  futuro. Ao  explicado sobre os clichês, acrescentamos que nosso espírito pode recebê-los ou simplesmente os ver. No primeiro caso, ocorre um presságio pessoal; no segundo, uma indicação fortuita que interessará ao sonhador somente de longe.

O sonho pode instruir, fornecer um ensinamento, mesmo de ciência positiva,  revelar segredos naturais, resolver uma dificuldade de mecânica, conceder  uma iluminação. Mas um sonho jamais nos ensina sobre a moral de alguém antes de sermos mestres de nós mesmos para conservar, malgrado tudo, sentimentos de indulgência, justiça e de benevolência. De fato, a traição, a duplicidade somente nos ataca quando as merecemos por nossa conduta anterior. Escamotear uma prova é um mau negócio; cedo ou tarde teremos  que sofre-la. 

A atividade do sono, às vezes, é transmitida ao plano físico. À força de  controlar os impulsos nervosos, passionais ou mentais, como meio de os submeter à lei do cristo, na esfera da consciência, o poder volitivo alcança as raízes secretas, na esfera do inconsciente. Adquirimos autonomia no meio dos sonhos mais movimentados; podemos: refletir, julgar, agir, como no físico, com toda a presença de espírito.  

Então o homem interior torna-se responsável, ele é verdadeiro; mas os limites de sua ação se estendem singularmente. E como este estado psíquico somente é acessível quando nosso coração já estiver penetrado no coração universal: o Verbo; os atos do sonho repercutem sobre o físico, devido a potencia que lhe confere esta penetração. Recebemos os benefícios dos anjos, os dirigimos, comandamos com a permissão do Céu; podemos curar, restituir a sorte ou mesmo evitar um acidente. Eis a primeira escala da teurgia.

O cérebro, o aparelho nervoso inteiro e a vida física se sutilizam progressivamente; a matéria pesa menos; e o dia chega quando o sono não é  mais indispensável ao registro na consciência das atividades espirituais. Acabamos por perceber simultaneamente o mundo físico e um dos mundos invisíveis; somos então, como dizem os brâmanes, um Dwidjà, duas vezes nascido, um homem de dupla consciência. Entretanto, observe bem, somente o  discípulo perfeito, do Evangelho, percebe o reino central do Invisível, aquele  onde  habita realmente o Verbo  Jesus. 

O cumprimento dos preceitos cristãos é a única porta desta morada  misteriosa; e a humildade mais profunda é o único alimento que pode sustentar o organismo submetido à esta dupla tensão; nenhum regime,  nenhuma droga, nenhuma disciplina humana permite, à Luz eterna, penetrar o ser do discípulo e de  regenerar até a moela de seus ossos. Contudo, quando um conselho é urgente, o Céu Se esforça para nos transmitir, mesmo durante a vigília, mesmo no turbilhão dos afazeres, não importa onde. Eis certos  fenômenos de telepatia, clariaudiência, e das aparições.



Continua.....

** Retirado e traduzido do livro de Paul Sédir: Lês forces mystiques et la conduite de la vie” ,  Paris, edição dos Amitiés  Spirituelles, 1977, Cap. 9,  págs 133 à 150.

** Tradução livre de Pseudo-Sedir.

sábado, 14 de março de 2015

Ensinamentos Martinistas de Swami Sevananda



                                                   A REALIZAÇÃO
                                                                          Por Sevananda Swami

Antes de entrar nos pormenores do ensinamento que pode levar à Realização, procuremos ver o que seja ela. O primeiro que se há de observar é que tudo o que tem valor na vida é subjetivo. Em outras palavras: tudo que é visível, como: dinheiro, obras de arte, edifícios, aparelhos etc., somente tem valor real, isto é, existe, por ser a representação, a expressão, o fruto, a manifestação de uma idéia. Nisso não há nem pode haver discordância.


Porém, se vamos à aplicação, isto é, à utilidade das ditas coisas materiais, veremos que têm por finalidade produzir determinados efeitos, que parecem mais ou menos tangíveis, como por exemplo, conforto ou comodidade física, saúde do corpo, bem estar mental, emoção estética. Tudo o que, em última análise, corresponde sempre à obtenção de determinados modos do PENSAR ou do SENTIR humanos, que são estados subjetivos.


Assim, quando dizemos de alguém que é uma boa pessoa, não nos referimos a nada da sua aparência, nem aos seus bens materiais nem de suas aptidões técnicas.
Dizemos, sim, que seu conteúdo moral ou espiritual é tal que não se pode esperar "mal" dessa pessoa. Em outras palavras, quando falamos de pessoas cultas, boas, honestas, dignas, santas ou geniais, não fazemos mais do que reconhecer a existência de valores subjetivos, que é o mesmo.


Por outro lado, é evidente que toda a existência, ainda no mais banal do viver diário, é pura subjetividade, atuante sob a aparência do objetivo, isto é, o jogo das mentes e das emoções que, em mil combinações, fazem a atividade do empregado, do chefe, do ator, do funcionário, dos pais, professores, alunos etc., tudo sempre encaminhado a conseguir exclusivamente RESULTADOS SUBJETIVOS, cujas manifestações ou resultâncias objetivas aceitamos, ou procuramos provocar, mas de qualquer modo terão que ser sempre manifestação externa da vida real, que é a vida interna do ser. Portanto, quando alguém termina a sua vida, em realidade viveu algo completamente subjetivo. Pensou, atuou, amou, sofreu, estudou, meditou, orou, serviu, em proporções e modos variados. Porém, seja como tenha sido a sua vida, foi ISSO: O Subjetivo. A aparência com a qual o conhecemos, os vários aspectos dele: jovem, velho, bem ou mal vestido, em pé ou deitado, vivo ou morto, são somente os ASPECTOS.


Sua vida, nossa vida, a vida de todos é, pois, feita somente de coisa subjetiva, feita de vivência interior, sem a qual seríamos "máquina 100%".

Expresso-o assim porque nos devemos dar conta, desde já, de alguns pontos essenciais, para evitar a perda totalmente inútil de tempo e de palavras:

1) É de capital importância dar-se conta de que a VIDA é puramente subjetiva, interna, espiritual, pois sem isso é impossível conceber uma realização. Em outras palavras, se a vida não fosse REALMENTE SUBJETIVA, toda realização imaginável seria MATERIAL em alguma proporção, e seria então desprezível e sujeita a mudanças, a condições de lugar, tempo, riqueza, frio, calor etc., como tudo que é físico. Ou seria puramente material, vale dizer que, como acreditam muitos aparentemente, a única realização é conseguir: dinheiro, posição, distinções externas e um concorrido enterro ao final de uma vida de banquetes, promoções, discursos e cheques. Portanto, ou bem a REALIZAÇÃO é plenamente espiritual em sua essência, ou não é possível.

2) A REALIZAÇÃO, para ser tal, deve preencher condições fundamentais, como: ser acessível a todos em possibilidade, sem o que não seria de índole justiceira; ser possível em todos os tempos, climas, raças e, dentro das limitações de preparação, a todas as idades, se considerar-se uma só existência.
Deve outorgar aos que a alcancem aquilo que redime o ser humano dos seus males fundamentais, que são: medo à pobreza, à doença e á morte. Medo à instabilidade do circunstancial: que são os afetos, as posições, as situações, as aparências de progresso pessoal. Medo à instabilidade da própria fé, á dúvida e a mil coisas, à série jamais interrompida de interrogantes que a vida, os seres e nós mesmos nos planteamos a cada momento.

3) Em conclusão, A REALIZAÇÃO deve dar ao que a alcance uma firmeza que, para ser estável, deve ter como base mínima estas condições:
a) Verificação da existência da própria Individualidade Espiritual.
b) Verificação da existência de um Mundo Espiritual tão palpável e organizado, quanto o são ou parecem ser os seres e coisas externas.
c) Contato pessoal e reiterável com tais fomes ou fonte de luz e de vida eterna; ou, pelo menos, de vida muito superior à física, corrente.
d) Harmonização do ser em novas condições de vida, cujas bases sejam felicidade, tranqüilidade, equanimidade e segurança, estáveis, aconteça o que acontecer ao seu redor.

CONDIÇÕES GERAIS DA REALIZAÇÃO

A posição do ser humano perante este problema é muito variável. Uns estão completamente indiferentes a tal inquietude; para eles somente é válido o concreto, o positivo ou prático (como eles o expressam). Deles pode-se e deve-se dizer que dão, voluntariamente, as costas à Realização. Veremos mais tarde a posição real.

Outros, pelo contrário, pareceriam que apenas ao ouvir falar sobre o tema, desejariam e chegam às vezes a expressá-lo de maneira que seria cômica, se não fosse dolorosa para eles - que se lhes enviasse "à volta do correio": saúde, felicidade, compreensão e comunhão com a própria Divindade, a qual citam com toda simplicidade, pedindo que se lhes facilite "realizar a Deus", como milhares de outras vezes teriam pedido solução para um detalhe da vida diária!

Ante tal contraste, usando-o como exemplo, temos que colocar esta primeira questão: deve- se ou não interessar a todos os seres pela Realização, ou deve- se esperar até que eles mesmos venham a ela. A segunda questão seria a de saber se todos eles podem realmente acercar-se a Realização, em tempos iguais. A terceira seria a de saber se os seres humanos "ganham" efetivamente algo ao alcançar ou buscar tal Realização, ou se como acreditam alguns - é melhor "permanecer tranqüilo em sua casa", seguindo a vida como estão habituados.
A verdade é muitas vezes dura. Neste caso o é mais ainda, porque se trata do fato mais importante da vida humana. Entretanto, por mais dura que seja ou pareça, precisamos dizê-la. Pois sem ela não é possível que o ensinamento seja entendido.

Quase todo mundo admite hoje que a era de progresso técnico que floresceu no Ocidente, no que se refere a este século principalmente, não nos tem conduzido a nada de bom. Os valores monetários, os modos administrativos ou governamentais, as normas familiares, os hábitos regionais e as normas tradicionais, tanto éticas quanto religiosas, morais como sociais, têm-se tornado cada vez mais instável.

Desde o famoso assunto de Agadir (1905), já não houve mais paz neste mundo.
Levamos, pois, meio século de lutas quase sem interrupção, pois todo mundo segue fazendo a guerra, uma vez que ninguém vive em paz, nem consigo mesmo nem com os vizinhos ou parentes; nem faz nada para ser, consciente e metodicamente, um construtor da Paz.
Pois bem. Assim são as coisas em todas as demais ordena. As coisas não andam melhor porque quase todos se queixam de como andam, mas porque quase ninguém faz algo para que melhorem. As condições gerais de Realização serão, pois, as que resultam no SITUAR-SE, isto é, de admitir as incontrovertíveis verdades coletivas que resultam do estudo da humanidade atual. As particulares serão a adaptação, como veremos.

O SONO DA ROTINA

O primeiro e maior obstáculo a toda e qualquer realização espiritual é que quase todo mundo dorme. Há anos que ensino isto e encontrei muito poucos que tiveram real interesse em serem despertados. E, segundo me consta da experiência de outro Mestre do qual Ihes falarei a seu tempo (Georges Gurjieff, cujo Discípulo mais conhecido foi P. D. Ouspensky), tampouco ele, não obstante a sua envergadura que tanto ultrapassa a minha, foi mais feliz neste sentido. E esta seria a primeira resposta a uma das três questões anteriores: fica evidenciado que não se pode falar da realização a todo mundo, porque muitos seres não querem e outros não podem se acercar a ela.

E não podem porque dormem. Dormem totalmente, ainda que o ignorem e muito se aborreceriam se alguém lhes dissesse. Ou, como verifiquei muitas vezes, não compreendem, riem-se e seguem dormindo. "Mas de que sono o senhor nos está falando?" - perguntou o leitor.

Vamos a isto. O ser humano acreditava até não muito tempo em dois estados: sono e vigília. E, quando não dormia - no sentido corrente que, esta palavra tem - acreditava estar bem acordado. Mais tarde admitiu-se que havia outros tipos de sono: sono com sonhos e sem eles; sono magnético, sono hipnótico, sono letárgico, sono anestésico. E vão seis!

Pois bem. O ser humano terá que aceitar por pouco que se importe, que há muitos outros estados de sono. É, por exemplo, um deles, o do que olha, ouve e não entende, como ocorrem todos os dias: o corpo está desperto, porém a mente está semi - adormecida, para poder ausentar- se por lugares ou fatos que lhe interessam mais do que aquele no qual se encontra! O que se habituou chamar de "distração" não é em realidade senão um sono que, a sua vez, tem cem modalidades e graus de intensidade. Mas há um tipo de sono mais notável ainda. É o dos robôs e autômatos de cada dia!

Um escritor fez, com certo humor, a descrição de um boneco que podia conversar em qualquer lugar: rua, escritório ou salão, pois tinha no seu interior cerca de duzentos "rolos", tipo "pianola" antiga, que lhe permitiam responder a qualquer pergunta, dado que as pessoas dizem sempre a mesma coisa sobre os mesmos temas.

Muito antes de ler essa novela, isto é, em minha juventude, eu já tinha chegado a esta mesma conclusão e visto que de cem pessoas, "noventa e tantas", ao receber o estímulo de uma frase qualquer - afirmativa ou interrogativa - sobre qualquer assunto, reagem com lugares comuns, de acordo com o que está escrito no jornal da manhã, da tarde ou na última revista etc. Para encontrar um conceito "PRÓPRIO" (certo ou errado, pouco importaria. . .) que prove que a pessoa pensou com sua própria cabeça, é preciso procurar muito.

O mesmo ocorre em quase todas as demais ordens da vida. As pessoas levantam-se, vestem-se, comem, trabalham, voltam a comer, deitar e levantar. Encerram-se assim cinco ou seis ciclos diários. O especial ritmo do domingo ou do feriado instala-se há seu tempo com a precisão de uma peça intercambiável. E os que trabalham organizam (?) sua vida diária com a mesma rotina, com a mesma falta profunda de originalidade, de sentido criador, de inquietude construtiva etc.

Resumindo: a vida tem-se transformado numa imensa rotina. E a velocidade tão louvada do viver atual quase obriga a mais e mais rotina. São 18 minutos para almoçar, se tomará o mesmo meio de locomoção e se responderá sempre do mesmo modo à mesma pergunta, pelo mesmo telefone, à mesma pessoa, que pergunta ou deseja a mesma coisa e se for possível, ao mesmo preço, único fator que não está incluído na rotina visível, mas está na outra rotina: dos aumentos periódicos de preços, ou relacionados com outros fatos rotineiros também.

E a mesma rotina faz impor: à criança uma vida padronizada, à professora ídem, e ainda sacerdotes e instrutores atuam com o tempo contado, o modo medido, a atuação estereotipada. E assim segue a fabricação de gerações cada vez mais padronizadas, cada vez menos originais, e nas quais o único lucro é um pouco de sentido coletivo.

Quase todas as pessoas têm noções gerais e superficiais de tudo; falam e falam muito mais do que necessário, baseados no que viram e ouviram na televisão. Qualquer pessoa opina sobre economia política, sobre religião, sobre filosofia e sobre arte, com uma ilustração de superfície, informada em fontes superficiais também.
Cada um se outorga a si mesmo uma condição em cada modalidade. São, por exemplo, católicos, democratas, liberais e cultos, conforme a definição que dão, sem que ninguém lhes peça.

Mas se observamo-los um pouco, descobriremos que nem praticam sua religião nem cumprem os preceitos cristãos; que burlam o quanto podem as leis, decretos e fiscalização, nesta mesma democracia que pretendem admirar e defender; que sua liberalidade termina onde começa o seu interesse, e sua liberdade mental termina quando surgem os prejuízos e o temor ao que dirão; que sua cultura é padronizada, que já esqueceram o básico do que estudaram e que, apesar de se envergonharem de carregar embrulho pela rua, seu progresso no que diz respeito à educação não vai até oferecerem o lugar em um coletivo nem deixarem de se acotovelar nas filas!

Surpreendem-se de não poderem acercar-se a REALIZAÇÃO, o que nos surpreenderia seria se conseguissem se acercar a ela, sem deixar antes sua rotina feita de mil defeitos, de mil teimosias, de mil indiferenças e, resumindo, de um enorme egocentrismo e uma total indiferença pelo alheio, o elevado e o desinteressado.

Eu sei que este quadro está um tanto exagerado. Mas não nos esqueçamos que o ensinamento tem por finalidade PROCURAR despertar os "que podem ser despertados", e não conheço despertador silencioso! Por outro lado, o que a pessoa que lê isto tenha de bom ou já desperto, ou em vias de realização, não será molestado por estas observações, que não têm caráter de crítica, mas apenas de diagnóstico diferencial. É necessário que o que dorme reconheça que assim está. E que decida por si mesmo se prefere seguir em seu "tranqüilo" sono ou se o atrai o despertar, com todos os incômodos que possa causar ao homem de rotina! Este é o significado do sono geral. Fiz muitas vezes a experiência com os dormidos. Faço-o ainda todos os dias, com muito pesar. Nada mais fácil que dar às pessoas a oportunidade de ouvirem alguma coisa espiritual, algo sutil, de fazê-las escutarem um fato ou uma definição relativa à REALIDADE. Geralmente o resultado é clássico: mal terminada a frase ou a ação de alguém, o dormido segue tranqüilamente com o que fazia ou falava antes. Não viu, sentiu, ouviu, compreendeu nem desejou nada.

Está encerrado dentro de sua rotina como o pintinho dentro da casca do ovo.

Sonha que vive. E a reiteração de tal sono convenceu-o, há tempos, de que assim é. E não deseja sair de um estado no qual pode seguir pensando PRINCIPALMENTE em si mesmo como pessoa visível. Portanto, não se os pode despertar a força, pois suas reações contra tais tentativas são más, tanto para eles quanto para os que os rodeiam. Não há outro remédio que os deixar em sua rotina e, no possível, os ajudar quando algo de grave - em qualquer modo - acontecer-lhes.

OS INQUIETOS

Dentro da enorme massa que compõe esta humanidade visível existem milhões de inquietos. Isto é, que têm dentro de si uma inquietude que os leva a não aceitarem exclusivamente a rotina. Já não dormem totalmente nem de modo contínuo. Têm veleidades ou momentos de despertar, ou, pelo menos, desejo de fazê-la. Qualquer coisa que não seja a vivência banal para pagar o sustento ou a escalada profissional ou social lhes estimula.

Aqui é, talvez, onde o querido Oriente não tenha a visão tão ampla como o Ocidente. Com isto quero dizer que os Sábios ou Iluminados do Oriente têm dado às vias de realização ou de preparação denominações que, sob uma ou outra terminologia, concluem sempre nos seguintes três aspectos: Ação, Conhecimento, Sabedoria. E consideravam a "Ioga, ou União, ou Síntese ou Realização" como um quaternário equilibrante.

Não é meu desejo nem minha finalidade fazer aqui uma análise - que eu poderia fazer facilmente - das causas de tal modo de ser das conclusões das mais conhecidas doutrinas do Oriente. Acima de todas as coisas, o que interessa é o fundamental e evito terminologias de tal ou qual escola, ao menos enquanto trato da REALIZAÇÃO como assunto geral.

Quando falarmos dos treinamentos que não são A Realização, senão apenas preparação a ela, teremos tempo para ver os modos, todos interessantes, necessários muitos, úteis cada um deles, para distintas pessoas.

O fato é que, se observamos os Inquietos, veremos que, ao nascer tal inquietude, ela se dirige para um destes quatro rumos:

SABER - (compreender, analisar', catalogar, comparar, sintetizar, aplicar, etc.)

CRER - (obedecer, amar, respeitar, pedir, venerar, superar-se, humilhar-se).

ATUAR - (orientar, decretar, aplicar, modificar, transformar, melhorar etc.)

CRIAR - (incluir, captar, conceber, plasmar, expressar, traduzir, transmitir).

Os significados que anotei entre parentes não são os únicos nem são os mais importantes talvez. Mas são típicas de cada umas das vias que o Inquieto segue. E são, outra vez, QUATRO FACES da eterna Pirâmide.

São: CIÊNCIA - RELIGIÃO - FILOSOFIA - ARTE. E é bem certo que ninguém alcançará a Realização sem haver equilibrado dentro de si estes aspectos. Tão certo é, como é certo também que há, às vezes, aparentes realizações em um ou mais modos, sem que os quatro estejam unidos. Mas então são realizações parciais. São a: iluminação MENTAL do sábio, são o êxtase DEVOCIONAL do adorador, são o sacrifício IDEAL do paladino, são o gesto INSPIRADO do gênio, mas são, por isso mesmo, um ou mais aspectos DA REALIZAÇÃO, sem ser ela mesma. Ela que, como a Flor, é sabedoria, beleza, utilidade, perfume e som: VIDA!

Portanto, o Inquieto manifesta seu momento evolutivo e seu modo de despertar por meio da escolha que faz de uma destas vias; e dá a norma da sua amplidão, ao poder ou não acrescentar uma ou outras destas vias.

Por isso, desde o ponto de vista do ensinamento, é preciso considerar que todo ser humano que possui alguma possibilidade efetiva (não falemos dos esforços mecânicos para obter o domínio rotineiro de qualquer aspecto científico, artístico ou outro, para fins puramente profissionais!) de ordem criadora, de modo inquieto, para promover a própria superação no exclusivo afã de ser melhor, ou de servir mais, ou de estar mais afinado com a Lei natural ou divina, ou para captar e dar mais beleza; dizíamos, todo ser humano que reúna tal condição deverá ser considerado INQUIETO, é dizer, alguém que está sendo despertado que o deseja ser, que, em algum modo e via, lentamente se acerca A REALIZAÇÃO.

Retirado do livro:  “Yo que Caminé por el Mundo” , Córdoba, Edt Selva, 1951 (Tradução: O Homem, esse conhecido, BH, editora Vinte e Dois, 1986; págs 21 à 36).

sábado, 7 de março de 2015

Visão Geral dos Doze Trabalhos de Hércules e o Caminho da Iniciação


Visão Geral dos Doze Trabalhos de Hércules e o Caminho da Iniciação
Por um S::I:: da OM&S


Ao estudarmos as narrativas de Hercules e seus Doze Trabalhos, inclusive correlacionando-os com a passagem através dos Doze Signos do Zodíaco, podemos abordar a questão do ponto de vista do aspirante espiritual ou iniciado, individualmente, ou do plano da humanidade como um todo. As provas a que Hércules se submeteu podem ser enfrentadas por milhares de indivíduos que trilham o caminho do desenvolvimento espiritual consciente e da iniciação. Cada um de nós é um Hércules em embrião; os trabalhos, que ontem foram de Hércules, são de toda a humanidade, ou pelo menos de todos aqueles que mantêm as rédeas de sua evolução em mãos, tendo em vista a iluminação espiritual. Os trabalhos de Hércules demonstram o caminho que aguarda o aspirante espiritual sincero, aquele estágio do buscador espiritual inteligente, onde, tendo desenvolvido a mente e coordenado suas habilidades mentais, emocionais e físicas, esgotou os interesses no mundo fenomênico e procura expandir sua consciência. Esse estágio sempre foi expresso pelos indivíduos mais evoluídos de todos os tempos.


Enquanto escalamos a montanha da verdadeira Iniciação, vamos eliminando todo medo e aprendendo a controlar as forças inerentes à natureza humana, até que possamos nos tornar um servidor da humanidade, eliminando a competição e os objetivos egoístas. Ao se aprofundar nos Doze Trabalhos de Hércules, torna-se claro qual deve ser a conduta de cada aspirante e iniciado no Caminho do Discipulado e da Iniciação Real.

Um grande desafio é trazer, para nosso dia a dia hoje, novas maneiras de expressar e vivenciar as velhas verdades contidas nestes mitos, de forma a ajudar as velhas fórmulas para o desenvolvimento espiritual a adquirirem nova e pulsante vida para nós. Este é o desafio de sempre atualizar a luta humana para se superar a natureza animal, fazer desabrochar a natureza humana e revelar a natureza divina oculta em cada um de nós, o que está tão bem configurado nos Trabalhos de Héracles.


Os Doze Trabalhos de Hércules oferecem um quadro sintético do progresso da alma, indo da ignorância à sabedoria, do desejo material à conquista espiritual, de tal modo que o fim possa ser visualizado a partir do início, e a cooperação inteligente com o propósito da alma substitua o esforço feito às cegas. Verifica-se que a história das dramáticas experiências desse grande e venerável Filho de Deus, Hércules ou Héracles, serviria justamente para focalizar qualquer uma das faces da vida o aspirante espiritual em seu esforço para expansão da consciência e realização espiritual. Este tema é tão rico e profundo, que todos nós, lutando em nossa atual vida moderna, podemos aplicar a nós mesmos os testes e provas, os fracassos e as conquistas desta figura heróica que lutou valorosamente para atingir a mesma meta que nós almejamos.


Através da cuidadosa e reflexiva leitura deste mito, talvez possam ser despertados na mente do buscador espiritual um novo interesse e um impulso renovado, pois diante de um tal quadro do desenvolvimento e do destino especial do homem, ele pode querer prosseguir com redobrada coragem e determinação na Senda.

Em sua narrativa mítica, podemos acompanhar como Hércules se esforçou e desempenhou o papel de buscador espiritual. Neste Caminho, ele desembaraçou-se de certas tarefas, de natureza simbólica, e viveu certos episódios e acontecimentos que retratam, em qualquer época, a natureza do treinamento e das realizações que caracterizam o homem que se aproxima da libertação pela senda iniciática. Ele representa um filho de Deus encarnado, mas ainda imperfeito, que definitivamente toma em suas mãos a natureza inferior e, voluntariamente, submete-a a disciplina que finalmente fará emergir o divino. É a partir do ser humano falível, mas que é sinceramente dedicado, inteligentemente consciente do trabalho a ser realizado, que se forma um iniciado ou um Adepto.


Duas grandes e dramáticas histórias têm sido conservadas diante dos olhos dos homens ao longo do tempo. Nos Doze Trabalhos de Hércules, o Caminho da Iniciação é retratado e suas experiências, preparatórias e que conduzem ao grande ciclo de iniciações, podem ser reconhecidas pelo homem que sinceramente aspira a este Caminho. Na vida e obra de Jesus Cristo, radiante e perfeito Filho de Deus, o Reparador, que penetrou o véu por nós, deixando-nos o exemplo para que seguíssemos seus passos, temos retratadas as etapas do Caminho Iniciático de Libertação ou Regeneração e Reintegração, que são os episódios culminantes para os quais os Doze Trabalhos preparam o discípulo.

O oráculo falou e suas palavras ressoam através das eras: "Homem, conhece-te a ti mesmo." Este

conhecimento é a mais importante realização no caminho do discipulado e a recompensa de todo o trabalho de Hércules. Sem este conhecimento, não se pode avançar seguramente na senda da Iniciação. Somente assim, o homem pode-se encaminhar firmemente para tornar-se definitivamente auto-consciente e intencionalmente se impõe a vontade da alma - que é essencialmente a vontade de Deus - sobre sua natureza inferior. 

Neste caminho, o indivíduo submete-se a um trabalho sobre si mesmo que demanda esforço e dedicação, pureza de coração e caridade, para que a flor da alma possa desabrochar mais rapidamente. Simbolicamente, é uma obra onde um solvente psíquico (psique = alma) consome toda escória e deixa apenas o ouro puro. É um processo de refinamento, sublimação e de transmutação, continuamente levado adiante até finalmente se alcançar o Monte da Transfiguração e da Iluminação. Em suma, trata-se de alquimia superior.


Os Doze Trabalhos demonstram exatamente este caminho acima, onde os mistérios ocultos e as forças latentes nos seres humanos são descobertos e têm de ser utilizados de maneira divina e de acordo com o divino propósito sabiamente entendido. Quando são utilizados desta maneira, o iniciado vê-se em sintonia com energias e poderes divinos similares, que sustentam as operações do mundo natural. Torna-se, assim, um trabalhador sob o plano de evolução e um cooperador com aquela "nuvem de testemunhas", a Igreja Invisível do Cristo, que através do poder de sua supervisão, e do resultado de sua realização, engloba hierarquias espirituais por meio das quais a Vida Una guia a humanidade para sua gloriosa consumação. Essa é a meta da série de trabalhos de Hércules, e com essa meta, a humanidade como um todo alcançará sua conquista espiritual grupal através das múltiplas perfeições individuais.

Outra grande e sábia maneira de se enxergar este mito é apresentá-lo como um aspecto especial da Astrologia. Acompanhamos a história de Hércules à proporção que ele percorre os doze signos do Zodíaco. Ele expressou, uma a uma, as características de cada signo, e em cada um, ele conquistou um novo conhecimento de si mesmo, e através desse conhecimento, demonstrou o poder do signo e adquiriu os dons que o signo confere. Em cada signo, vamos encontrá-lo superando suas próprias tendências naturais, controlando e governando seu próprio destino, e demonstrando o fato de que astros predispõem, mas não controlam.


Esta visão astrológica do mito é uma apresentação sintética dos acontecimentos cósmicos que se refletem em nossa vida planetária, na vida da humanidade como um todo, e na vida do indivíduo, o qual é sempre o microcosmo do macrocosmo. Este estudo fornece indicações claras para a compreensão dos propósitos de Deus para a evolução do mundo e do homem. Somente a consciência de que somos partes integrantes de um Todo maior e o conhecimento da divina totalidade, pode revelar o propósito mais vasto. Hércules representou astrologicamente a história de vida de cada aspirante espiritual e iniciado, e demonstrou o papel que a unidade deve desempenhar na Obra eterna. 


A analogia astrológica dos Doze Trabalhos de Hércules diz respeito aos doze tipos de energias por meio dos quais a consciência da Realidade divina é obtida. Através da superação da forma e da subjugação do homem inferior, é-nos mostrado um quadro do desenrolar da auto-realização divina. Hércules, em seu corpo físico, embaraçado e limitado pelas tendências a ele conferidas pelo signo no qual ele cumpria sua tarefa, alcançou a compreensão da sua própria divindade essencial.

As provas a que Hércules voluntariamente se submeteu, e os trabalhos a que, às vezes impensadamente, atirou-se, são aqueles possíveis para muitos de nós ainda hoje. É evidente que, curiosamente, vários detalhes da sua dramática, e às vezes divertida, história dos seus esforços de ascensão podem ser aplicáveis em nossas vidas modernas. Cada um de nós é mesmo um Hércules em embrião, deparando-nos com idênticos trabalhos; cada um de nós tem a mesma meta a conquistar e o mesmo círculo do Zodíaco a abranger. Hércules aprende a lição de que agarrar-se a qualquer coisa do eu separado não faz parte da missão de um filho de Deus. Ele descobre que é um indivíduo, apenas para descobrir que o individualismo deve ser sabiamente sacrificado pelo bem do grupo. Ele descobre também que a ambição egoísta não tem lugar na vida do aspirante espiritual que está em busca de libertação dos ciclos recorrentes de existência e da constante crucificação na cruz da matéria. As características do homem imerso na vida da forma e sob o domínio da matéria são o medo, o individualismo, a competição e a cobiça. Estes têm de ceder lugar à confiança espiritual, à cooperação, à consciência grupal e ao altruísmo.

Esta é a lição que Hércules traz; esta é a demonstração da vida de Deus que está sendo trazida à operação no processo criativo, e que floresce, de maneira sempre mais bela, a cada volta que a vida de Deus faz em torno do Zodíaco. Esta é a história do Cristo cósmico, crucificado na Cruz Fixa dos céus; esta é a história do Cristo histórico, apresentada nos Evangelhos e representada, na Palestina, há dois mil anos; esta é a história do Cristo individual, crucificado na cruz da matéria e encarnado em cada ser humano. Este é a história de nosso sistema solar, a história de nosso planeta, a história do ser humano. Assim, ao admirarmos os estrelados céus acima de nós, temos eternamente representado para nós este drama magnífico, o qual é detalhadamente explicado ao homem pelos Doze Trabalhos de Hércules.